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Dificuldades podem acabar com cooperativas de catadores

06/05/2016

A quantidade de materiais que está chegando reduziu quase pela metade nos últimos meses. Como consequência, os trabalhadores estão passando por dificuldades financeiras, trabalham sem material adequado e não sabem até quando terão emprego. A permanência no local atual também está sendo discutida. Na contramão, Famcri afirma que não houve queda nos materiais.

Uma situação que se estende desde agosto de 2015. A Associação Criciumense de Catadores (Acrica) continua passando por dificuldades e estão recebendo menos materiais recicláveis. Segundo o presidente da Acrica, Rogério Barbosa Bazílio, falta incentivo e consciência das pessoas em fazer a separação do lixo.

“Já faz de cinco a seis meses que estamos recebendo menos materiais. O pessoal não está separando em casa, se cada um separasse teria bastante. Não tem pessoas da Fundação do Meio Ambiente de Criciúma (Famcri) batendo de porta em porta para educação ambiental”, enfatiza o presidente.

Uma das principais causas apontadas no ano passado foi a queda nos preços dos materiais em até 40%. Com isso o quadro de funcionários começou a reduzir, passando de 23 para seis.

“No fim de dezembro de 2015, começaram a entrar mais trabalhadores e hoje estamos com 20 pessoas, uma equipe boa. Com a redução dos preços, as pessoas só conseguiam tirar R$ 300 ou R$ 400. A base do nosso salário é R$ 860”, lembra Bazílio.

Atualmente, o salário está sendo pago em dia, mas os atrasados dos meses de agosto, setembro e outubro ainda não foram pagos. Mesmo assim, a situação está complicada.

A Acrica recebe todos os dias dois caminhões, o primeiro chega às 11h e o segundo às 16h. No fim de 2015, cada caminhão entregava aproximadamente 1,2 mil quilos, sendo que 200 quilos eram só de lixo não reciclável. Hoje, recebem 200 a menos.

“Tem muito lixo junto, coisa que não é para vir. Estamos trabalhando sem luvas, alguns estão com alergias. Estamos nos mantendo como podemos, tem muitas pessoas passando necessidade em casa. O que vier é bem-vindo e nós agradecemos. Precisamos de roupa de cama, quem paga aluguel não tem como comprar nada, precisamos de comida e roupas, principalmente para as crianças”, frisa.

Para não ficarem parados, os catadores estão deixando uma parte dos materiais para separar no dia seguinte à entrega. Conforme Bazílio, isso é necessário para que os trabalhadores não fiquem sem atividades até as 11h do dia seguinte, quando chega o primeiro caminhão.

Permanência no local atual

De acordo com o vereador José Carlos Mello (PT), o terreno onde a Acrica está é dividido junto com o Ecoponto. O local é alugado pela Prefeitura, que paga R$ 2,5 mil para a parte da associação, e a Famcri paga mais R$ 2,5 mil para a parte do Ecoponto. Na segunda-feira, 2, foi realizada uma reunião entre a fundação, a Acrica e o vereador para discutir a permanência da associação no local.

“Aqui o galpão é grande e tem espaço para mais materiais. Tem um terreno, que na época do Salvaro, prometeram nos ceder, mas não passou pela Câmara de Vereadores. Está um rolo, uma hora é nosso, outra hora não é mais”, acrescenta o presidente.

“Na reunião, sugerimos a ideia de tirar o Ecoponto e levar para outro local, e que ficasse ali apenas a Acrica. Pedimos também que a Famcri pudesse fornecer material e uniforme para eles. Havia uma promessa na época para ceder o terreno e que depois fosse construído um galpão. Vou fazer um pedido ao governo para ver que em situação está isso”, ressalta Mello.

Ctmar apresenta os mesmos problemas

Além da Acrica, a Cooperativa de Catadores de Materiais Recicláveis (Ctmar) também recebe materiais da Coleta Seletiva de Criciúma. Mas a situação é a mesma em ambos locais.

Diferente da associação, a Ctmar recebe dois caminhões pela manhã e outros dois à tarde. A vice-presidente da Ctmar, Marli Mello, enfatiza que há mais de dois meses a quantidade de material reduziu.

“Estamos recebendo bem menos. Antes, os caminhões vinham cheios e, agora, recebemos só metade. Se somar os quatro caminhões não dá um. Não sabemos o motivo, falamos com a Famcri e eles disseram que também não sabem. Na minha opinião, é falta de interesse do poder público de enxergar que tem gente trabalhando aqui, que tem mãe que sustenta a família sozinha. Não adianta vir em época de eleição fazendo promessas. Não temos apoio de ninguém”, destaca.

Com a redução na quantidade de materiais e nos preços, a dificuldade para manter os salários e os 20 funcionários em dia é cada vez mais difícil. Os catadores recebem ajuda psicológica de profissionais da Unesc, com quem conversam e tentam entender a atual situação.

“Ontem, falamos com a psicóloga, estamos pedindo socorro. Graças a Deus ainda não estamos sem salário, apesar de ter diminuído. Se continuar assim, o material que chega não vai comportar e vamos ter que demitir. E vai tirar quem? Porque as pessoas que estão trabalhando é porque precisam e onde vão trabalhar agora com a crise?”, afirma Marli.

“Estamos com bastante dificuldade, porque se vier pouco material o salário vai diminuir. Dependemos disso, temos família, filhos. Têm pessoas aqui que pagam aluguel e está difícil. Não sabemos o porquê da redução. Uns dizem que tem catadores passando nas rotas dos caminhões, outros não sabem, está ficando complicado”, enfatiza a catadora de material reciclável Daiane Hendler Evalte.

Sistema deficitário e mudança da empresa

Em novembro de 2015, um fórum foi realizado para discutir dificuldades, melhorias e inclusão dos catadores. Mas de acordo o professor de Engenharia Ambiental Mário Ricardo Guadagnin, a situação continua atrasada.

“O sistema está bastante deficitário, há ausência de gerenciamento do poder público em desenvolver programas de educação ambiental. Reduziram os estagiários que faziam esse processo, que iam de porta em porta, faziam abordagem e triagem. E isso levou à diminuição da coleta”, relata.

Para o professor é necessário estimular, sensibilizar e criar outras estratégias de conscientização, pois falta continuidade. Guadagnin ainda explica que a situação pode se agravar com a mudança da empresa responsável.

“O contrato com a empresa que presta o serviço está em licitação. Isso pode interferir. A coleta seletiva foi conquistada por pressão do Fórum Lixo e Cidadania de Criciúma. Pode estar emperrando o processo e não é muito discutido, porque não há socialização do plano de resíduos de Criciúma”, esclarece o professor.

Segundo Guadagnin, uma empresa foi contratada para fazer diagnóstico do Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (Pmgirs) de Criciúma. Cinco audiências pública foram realizadas entre fevereiro e março para debater junto à população a realidade e sugestões de melhorias.

“A lei nacional exige que todos os municípios tenham um plano de descarte de resíduos. Concluímos a fase de diagnóstico da situação. Agora, estamos aguardando a apresentação de propostas pelo grupo gestor que foi definido por decreto, tem também o grupo de sustentação que dá apoio. Nesse processo, surgem as propostas, algumas são leis e tem que fazer. Outras dependem de conversa e mobilização”, ressalta o coordenador do Fórum Lixo e Cidadania de Criciúma, Adonai Pacheco Teixeira.

O professor frisa que são necessárias algumas medidas como planejar ações, levar saúde aos catadores e que seja feito um mapeamento dos trabalhadores pela Secretaria de Assistência Social.

“Eles catam para sobreviver, não há sensibilização do poder público. Falta vontade política, assumir isso como prioridade. Tem uma população de catadores que não é vista, não só os da Acrica e Ctmar, mas os catadores autônomos. Se não chamar a atenção para o descaso, Criciúma vai continuar fazendo de conta”, destaca Guadagnin.

Segundo Teixeira, é necessário que retomem a educação ambiental por parte da Famcri com os estagiários. O coordenador cita que a Campanha da Fraternidade deste ano trabalhou a questão de saneamento básico e um dos assuntos foi a coleta de resíduos.

“As comunidades querem fazer, tem é que ter resposta do poder público. A paróquia da Cidade Mineira fez um pedido a Famcri para participar da coleta. Além disso, os catadores têm uma série de reivindicações, como terrenos, porque eles (Acrica e Ctmar) estão em locais precários e não são deles. O da Ctmar é cedido pela Unesc, que já pediu o terreno de volta algumas vezes”, acrescenta.

Famcri: “Não teve queda”

Contrariando os catadores da Acrica e Ctmar, a coordenadora da Coleta Seletiva da Famcri, Julia Schmitd Ghizoni, afirma que a quantidade dos materiais recolhidos continua a mesma.

“Temos todas as pesagens, estão na mesma quantidade de antes, não teve queda. Eles sempre reclamam, sempre vão reclamar. Já conhecemos”, frisa.

Sobre os estagiários que faziam o de “porta em porta”, a coordenadora diz que é consequência das demissões feitas pela Prefeitura no fim de 2015. Mas a situação irá mudar após a escolha da nova empresa que será responsável pela coleta de lixo no município. Hoje, a Coleta Seletiva passa por 57 bairros de Criciúma.

“Agora, com a troca, a nova empresa terá que ceder quatro estagiários para realizar esse trabalho e ainda temos um que continua aqui conosco. Não adianta trabalhar com mais de que isso, se não eles terão que fazer várias viagens com o carro”, esclarece.

Conforme Julia, atualmente existe o “Projeto de Educação Ambiental Permanente (Proamp)” que trabalha com as turmas dos 4º anos das escolas da Rede Municipal. O programa permanece um mês em cada das seis regiões de Criciúma: Pinheirinho, Próspera, Rio Maina, Centro, Santa Luzia e Quarta Linha.

O programa já passou pelas unidades da Quarta-Linha e agora está na Santa Luzia. O coordenador do Proamp, Jean Luzio, afirma que aproximadamente 12 escolas foram atendidas e que o projeto é realizado por uma equipe formada por sete funcionários da Famcri e um contratado.

Satc

 

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